Para quem puder acreditar.

E lá estavam a pasta e a escova sobre a pia, como em todas as noites. Desde a infância, durante a adolescência, até o dia anterior do meu casamento.

Sobre a pia a dupla, esperando por mim , sinalizando que ele se importava, que ele sempre me esperava acordado. Tudo preparado com carinho do jeito dele. Todos os dias aquele carinho que só podia vir dele, um carinho silencioso, um código só nosso.

Já adulta, quando saía , sabia que ele não dormiria enquanto eu não voltasse. Quando chegava essa lembrança , me recebia e dava a certeza do afeto. Assim que eu me deitava, ele vinha ao meu quarto me cobrir e dar boa noite.

A pasta e a escova era nosso silêncio, nossa conexão, sem comentários, sem obrigados, apenas nós, Contando , ninguém acreditaria, mas sempre estavam ali. Nossa ligação sempre foi muito forte, um amor de pai e filha.

Meu pai era muito severo na disciplina com todos, era bravo, mas pai aos 40, quando eu cheguei, amoleceu de alguma forma, sei que eu trouxe mais leveza para ele.

Seus cuidados sempre me sustentaram, eram minha fortaleza . A despedida não aconteceu como queríamos , mas foi como pôde ser. Do nosso jeito. A doença nos pegou de surpresa, apesar da idade sua saúde era incrível, ficar doente não estava nos nossos planos a velocidade que ela avançava nos tirava do prumo. Ele não queria ir e não queria conversar sobre isso. Sofria. Eu sentia que um pedaço de mim se desprendia aos poucos.

Sua partida foi doída, não era normal falarmos do que doía. Teríamos tempo para nos despedir, para falar sobre tudo, mas não tivemos coragem, pena. Tínhamos um mecanismo de nos poupar.

Nossa história da escova e pasta de dentes ficou no passado, ainda quando eu morava na casa dos meus pais. mas estavam presentes, na memória.

Assim que ele partiu, ao voltar com minha mãe para casa, a pasta e a escova estavam lá, na pia do banheiro que eu usava,

Foi como um adeus que só nós reconheceríamos.