Daisy Gouveia

O tempo

O tempo

O reflexo no espelho.

De repente ao olhar-se no espelho, o espanto.

Cadê aquela carinha de criança que precisava subir num banquinho para alcançar o espelho do banheiro? Ou mais tarde aquela carinha que vire e mexe aparecia com carocinhos indesejáveis , nas horas e nos dias mais inconvenientes, e que precisavam de uma pomadinha cicatrizante, tipo hipoglós , para amenizar os efeitos avermelhados no rosto, na adolescência? Cadê?

Essas carinhas foram substituídas pela adulta, com outras marcas não menos indesejáveis de amadurecimento.

Pois é, o envelhecimento não é controlável. Ele aparece em algum momento e nos surpreende, como se o tempo não tivesse passado e procuramos aquela juventude.

As marquinhas vão se formando pelos momentos mais difíceis e pelos fáceis, vão se acumulando e trazendo uma outra figura no espelho. A figura que se reflete viveu, amou , foi amada, foi traída, foi feliz, perdeu, ganhou, falhou e venceu, e isso pode se tornar belo ou feio.

Já reparou que algumas pessoas ao envelhecer se tornam mais bonitas do que eram na juventude? Podia fazer aqui uma lista delas, mas não seria gentil, principalmente com outras que eram tão bonitas e se tornaram mais feias. Acho que isso tem a ver com o que se viveu. Tem a ver em como nos tratamos ao longo desse viver. Se deve mais a nós , do que ao tempo ou a terceiros. Depende da forma que reagimos a cada movimento do sofrimento e da felicidade.

Sabe aquela frase, recebe um limão e faz uma limonada? Transforma o ruim em bom? Acho que vivi por aí, fui sempre feliz, sempre sofri por pouco tempo, transformei em conhecimento, sabedoria, sem querer parecer presunçosa, mas simples.

Envelhecer, amadurecer com gentileza, pode trazer marcas mais suaves. O espelho, grande revelador , pode trazer as marcas da felicidade de ter sido mãe, avó, mulher. De ter amado, ter sido amada, acariciada, conquistada e ter conquistado .Tudo junto e misturado, mas também atrás de outras surpresas menos leves.

Aceitar o tempo não é tarefa fácil. Assim caminha a humanidade.

21 e 64, cada marca em seu tempo.
Daisy Gouveia
Daisy Gouveia
domingo, 28 de agosto de 2022
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